Com Jesus até às fronteiras do Mundo
A segunda semana dos Exercícios Espirituais tem início com a meditação do Rei Temporal, o homem, como ajuda à contemplação da vida do Rei Eterno, Jesus Cristo [EE.EE. 98 – 100]. Esta proposta de oração dá a tónica para, durante toda a segunda semana e as seguintes, contemplar o Cristo proposto pelos evangelhos, através de um convite radical a segui-lo: Jesus chama-nos e conta connosco! Todo o projeto de vida que queira ser vivido em profundidade é sempre resposta a um chamamento.
No início desta meditação, Santo Inácio desafia-nos a imaginar um rei humano, querido e respeitado por todos, que convoca o seu povo para a maior aventura que se possa imaginar, partilhando com ele trabalhos e vitórias. Afastando-nos de uma interpretação excessivamente literal deste personagem da meditação, hoje, podemos identificar este rei humano com um homem ou uma mulher que admiremos pelas suas qualidades. Em seguida, a meditação avança e Santo Inácio convida-nos a ir mais longe. Num segundo momento, somos convidados a contemplar o próprio Jesus e a escutar o mesmo discurso vindo da sua boca, acolhendo o convite que Ele dirige a cada um: VEM, SEGUE-ME (Mt 9,9). No entanto, por que motivo devemos responder a este chamamento? Experimentando a proximidade de este Deus que conta com cada um de nós para transformar o mundo, somos chamados a descobrir o quão grandes podem ser os nossos desejos e a experimentar como a nossa missão de educadores inacianos se realiza diariamente em muitas das coisas que já fazemos.
Jesus chama-nos a estar com Ele: a conhecê-lo, a apaixonarmo-nos pela sua maneira de entender a vida e de se relacionar com Deus Pai, a apaixonarmo-nos pela sua Palavra. Este convite é contínuo, não tem fim, e exige que não sejamos surdos ao seu chamamento [EE.EE. 91], mas audazes, prontos e diligentes na resposta.
Sem esquecer que fazemos parte de uma comunidade maior, a Igreja, e que este convite de Jesus também se descobre no seu seio (Mt 16, 18), sem esquecer que fazemos parte de um mundo muito maior que os nossos pequenos limites individuais, este ano queremos concentrar-nos no chamamento que Jesus nos dirige. Jesus chama cada um pelo seu nome (Is 43, 1).
Nos dias de hoje, fazemos parte de uma sociedade repleta de estímulos e muitos tipos de chamamentos, convites que, muitas vezes, prometem dar sentido à nossa vida e enchê-la de felicidade, mas que, no fundo, não cumprem o que prometem. São convites que nos fecham sobre os nossos próprios desejos e interesses [EE.EE 189] e que não nascem do Amor.
O chamamento de Jesus nunca surge sozinho é imediatamente acompanhado de um convite claro e vinculativo: SEGUE-ME (Mt 19, 21). Exige de nós uma resposta. Não consiste apenas no conhecimento de Jesus, do seu projeto de vida, da sua forma de ser, mas também implica a descoberta da missão que Jesus tem para cada um. Nas palavras de Santo Inácio, esta missão consiste em conquistar com Ele o mundo inteiro. Mas a quem teremos de derrotar? O inimigo da nossa humanidade, isto é, tudo o que destrói a dignidade da pessoa, tudo o que tenta contaminar e destruir a criação, tudo o que nos afasta da vontade de Deus. Tudo isto são coisas concretas e definidas, são pessoas com nomes, apelidos e histórias.
O campo de ação encontra-se na nossa vida quotidiana, em todo o mundo, de um modo particular nos “lugares” que são fronteiras. Alguns estão muito próximos: os nossos medos, fracassos, limitações ou preconceitos. Outros estão mais distantes: a desigualdade, a violência, a guerra, a fome de justiça? As nossas armas não serão outras senão o amor, a fé e a esperança, que o Espírito de Deus, que habita em nós, semeará nos nossos corações. Com estas armas poderemos ser instrumentos eficazes na criação de um mundo mais justo, na construção de uma realidade mais inclusiva, em que todos tenhamos um lugar digno para viver. A construção de um mundo mais equitativo, sem discriminações de qualquer tipo, mais sustentável e em que todas as vozes sejam ouvidas. Tudo isto somos convidados a viver com Ele e como Ele, com fé em Deus e nos seres humanos, com fé na promessa de um mundo em que o amor e a vida tenham a última palavra.
Concluindo, a proposta para este ano letivo é de uma escuta atenta - um apelo e um convite – e de uma resposta generosa a uma missão que não realizamos sozinhos. Perante o perigo de cair num mero voluntarismo efémero, Santo Inácio alerta-nos para a necessidade de olhar e contemplar Jesus, assimilando internamente a sua maneira de ser e estar. É Ele que nos conduzirá às fronteiras. Com Ele poderemos responder com sentido, empenho e profundidade a um chamamento que olha com misericórdia e amor para a nossa fragilidade e vulnerabilidade.